sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Eterno Amor

Eterno Amor
Athayde Martins

Fabrício fitou uma moldura sobre sua mesa e seus olhos ficaram maravilhados com o sorriso daquela linda moça que o abraçava carinhosamente na fotografia amarelada. Sua mente rasgou tempo e espaço procurando momentos que marcaram sua juventude. Romântico ao extremo ele, poeta nato, numa época que a leitura era quase que obrigatória para todos. Fabrício um modelo de rapaz. 


Mona Lisa, carinhosamente chamada de Mona pelos parentes e amigos, não resistiu a rosa vermelha, o jeito meigo, doce e quase ingênuo de Fabrício e naquela tarde chuvosa de 08 de Março de 1940 um grande amor nascia entre ambos, uma flor selando o amor.

Aquele romance marcou profundamente a vida dos dois, eles eram inseparáveis, a corda e a caçamba. Um completava o outro e vice-versa. Mona Lisa, filha de família nobre na cidade e Fabrício, apesar de inteligente era filho único do mecânico Fábio e da doméstica Alice. O casal de acordo com os valores morais da época tinha absolutamente tudo para não dar certo.
Com o passar dos anos aquele amor aumentava de tal maneira que às vezes chegava a sufocar e os corações daqueles jovens batiam forte, apesar da força da paixão, algo extremamente maligno se colocava como uma barreira intransponível entre os dois. Ricardo, moço bonito, culto e de linhagem nobre nutria por Mona Lisa um amor violento e quase doentio.

Aquele triângulo se transformou em bomba relógio e a guerra de Ricardo para conquistar seu impossível amor estava declarada. A repulsa que Mona Lisa sentia por Ricardo era tão forte quanto o amor que nutria por Fabrício. Os pais da moça, ricos e respeitados criadores de gado faziam de tudo para que a filha se casasse com o filho de um dos maiores produtores de café daquele estado. Nos anos que antecediam a segunda grande guerra o café já era considerado um dos produtos mais valiosos do Brasil, assim como a agropecuária era tida como lucro certo para os reis do gado.


A união de ambos seria muito vantajosa financeiramente para as duas famílias. Mas tinha um entrave: Mona não suportava Ricardo e amava Fabrício seu plebeu romântico e sonhador. O tempo passou e Mona não resistiu à pressão vinda de todos os lados. Sofrendo ameaças violentas, Fabrício preferiu se afastar para não colocar em risco a integridade física de sua amada. Ele mergulhou nos estudos e se tornou um brilhante médico e seu senso de solidariedade o levou a perambular pela cidade com sua maleta atendendo famílias carentes residentes na periferia.
O doutor Fabrício era tido como uma espécie de santo pela população mais pobre da sociedade e isso despertava um ódio mortal no coração de Ricardo, que lutava com todas as armas para conquistar o coração de Mona.
A moça de sorriso encantador aos poucos perdia o brilho e seus olhos tristes estampavam total desencanto pela vida. Como clínico geral, doutor Fabrício, além do plantão do hospital e no seu consultório, ainda continuava arrumando tempo para visitar seus pacientes menos favorecidos pela sorte.

O médico mergulhou na solidão e praticamente se casou com a sua profissão. Estudioso e dedicado, ele, com 34 anos já era um dos mais respeitados do país. Mona com 29 formada em filosofia se limitava a lecionar na faculdade local. Eduardo com 31 anos gerenciava um dos bancos de sua família. Os três jovens, infelizes, cada um por seu motivo, aos trancos e barrancos tocavam suas vidas. Mas na teia da existência o destino envolve as pessoas como num tabuleiro de xadrez e quando menos se espera...
XEQUE MATE.

A saúde de Mona era frágil e com o passar dos anos uma misteriosa doença sugava suas energias. Faltavam apenas dois meses para o casamento de Ricardo e Mona Lisa. A sociedade movimentava-se com fofocas em torno de um enlace puramente comercial.

Nesta época a união de dois jovens descendentes de poderosas famílias tornava-se puramente um negócio, o amor não era levado em conta. Casamento assim tornava-se rentável para todos menos pra quem se casava. Doutor Fabrício, curava suas feridas amorosas trabalhando. Ele via á cada dia sua amada se distanciar. Mona ainda o amava com todas as forças do coração, mas não podia desgostar seus pais e seus futuros sogros.
  
Aquela situação era como uma sentença de morte e apesar de saber que não era amado, Ricardo apressava os preparativos para a festa que com certeza seria uma das mais badaladas dos últimos anos. O tempo passava sem piedade! A saúde de Mona piorava. Numa das visitas a uma das muitas pacientes pobres o doutor Fabrício teve uma surpresa. Enquanto ela humildemente lhe preparava um café ouvindo um rádio sobre o armário da cozinha transmitiu a seguinte notícia: “Jovem filha do famoso produtor de café foi encontrada morta em seu quarto. O fato pegou a todos de surpresa, ela se casaria em 15 dias.”

Os olhos marejados de Doutor Fabrício chamaram a atenção da paciente:

- O senhor conhecia a moça doutor?

Ele demorou um pouco para responder:

- Sim!

Mais uma longa pausa seguida de um suspiro:
- Eu a conhecia.

Agradeceu o café pegou sua maleta e com o coração partido entrou no seu carro e sumiu no meio da chuva.

Cinquenta anos se passaram Fabrício agora com 84 anos vivia das lembranças daquele imenso amor, o sorriso de Mona ainda iluminava sua caminhada rumo ao horizonte sem fim. Todos os anos ele visitava o túmulo de sua amada e deixava sempre uma rosa vermelha no local.

Naquela chuvosa tarde de 8 de março de 2000, um dos funcionários do cemitério se surpreendeu com um senhor muito bem vestido deitado sobre a lápide de Mona. Imediatamente acionou a polícia, ao chegar o médico legista concluiu que aquele homem estava morto, em sua mão uma foto empoeirada com dois jovens sorridentes tinha em seu verso a seguinte frase:

“Fabrício, nunca deixarei de te amar”

A data era bem visível: 08 de Março de 1940.

Diz a lenda que em noites de céu estrelado e lua cheia um casal sorridente corre alegremente pelas alamedas do cemitério.



FIM.

4 comentários:

  1. Parabéns Mestre, adorei, super instigante.

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Que coisa mais linda, pai!!! Arrepiei com o final <3 Parabéns!!

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  4. Puxa, é triste, mas nem por isso menos belo. Parabéns por sua criatividade e sensibilidade, amigo escritor. Quantos amores sucumbiram à ambição? Ao preconceito social? Uma reflexão...

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